Ambientalismo e Desenvolvimento (1)

Artigo 21, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Fev 2008

© 2005-2018 Fabio Ortiz Jr

 

Capítulo Seis:  tratemos então das relações entre Ambientalismo e Desenvolvimento.

Vamos subir.  Subamos ainda mais para ver o mundo de um ponto de vista bem alto.

O cosmonauta Yuri Gagarin, o primeiro homem a alcançar o espaço, em 1961 (eu estava lá!), achegando-se à escotilha da nave exclamou extasiado: “A Terra é azul...

Diz Edgar Morin, profusamente citado no artigo anterior, que “a cosmologia contemporânea tem renovado o conhecimento do mundo”.

Sem dúvida: uma das fotos mais divulgadas mundo afora é a que mostra a Terra como uma esfera quase azul (os oceanos e a atmosfera), com manchas marrom-esverdeadas (as terras emersas) e outras brancas (as nuvens), esta nossa casa flutuando na imensidão de um espaço quase negro.  Quando os astronautas das missões Apollo revelaram esta imagem ao mundo, contribuíram para que nossa percepção a respeito de nosso planeta, do universo e de nós mesmos mudasse e evoluísse.

Cumpria-se assim, de outro modo, a finalidade do ensino: no dizer de Morin, a possibilidade de “o indivíduo reconhecer-se em sua própria humanidade, situando-a no mundo e assumindo-a”.

Comecemos agora a baixar, aproximando-nos aos poucos da Terra para a examinarmos melhor e com mais detalhes.

Aqui recomendo a todos, disponível em DVD, um filme chamado Blue Planet (Planeta Azul), um primor de concepção e realização.  Será uma viagem inesquecível.

Para os que têm acesso à Internet, sugiro uma visita às páginas da Embrapa (www.embrapa.br), onde poderão ver o território brasileiro em ótimas fotos de monitoramento por satélite .  Há também o excelente GoogleEarth.  Localizem o Estado de São Paulo e avancem na aproximação.

O momento inicial de encantamento com a bela imagem, que nos mostra cores, contornos e relevos, vai gradativamente dando lugar a um certo desconforto quando passamos a identificar certos padrões (nem sempre as cores são reais, para efeito de realce).

Notamos áreas em azul-marinho, que correspondem às águas (oceano, rios e lagos), em verde escuro e verde claro (algumas poucas áreas ainda florestadas), em marrons claros e escuros (a maioria delas), inúmeras formas geométricas (áreas cultivadas, estradas) e estranhas manchas cinzentas que, à medida em que as vamos compreendendo, passam a nos chocar: são as cidades e seus entornos, as ditas manchas urbanas.

Remeto-me imediatamente ao passado: em algum dia longínquo em minha vida notei a maneira como uma fruta apodrece no cesto.  Um fungo (mofo ou bolor são os nomes populares de vários deles), uma forma muito antiga e primitiva de vida, ali se estabelece em um ponto ligeiramente mais frágil da fruta, mas que a ele é propício.

De início invisível para nós, aos poucos ele vai crescendo; não em tamanho, mas sim em número.  Quando se torna visível, em poucos dias toma conta completamente do fruto e o consome enquanto continua a se multiplicar, até que nada de proveito reste nem mesmo para sua própria continuidade.  Esgotado o fruto, toda a colônia afinal perece; e ambos desaparecem.

Hoje a visão de uma destas imagens me leva inevitavelmente à outra.  É claro que em nenhum dos dois casos o que acabei de dizer é a história toda, mas o resumo e a imagem (a metáfora) são consistentes.

Todos nós, ao longo de nossas vidas, temos ouvido discursos e mais discursos, especialmente em épocas eleitorais, que buscam enaltecer propostas de crescimento, seja econômico, seja social ou o que for.

Curiosamente, mas sem surpresa alguma, à medida em que foi-se desenvolvendo na população em geral uma certa percepção com relação aos danos que temos provocado no equilíbrio ambiental de nossa era, vimos também uma adequação destes mesmos discursos para incluir então dois termos novos: meio ambiente e desenvolvimento (e este último agora acrescido de um adjetivo, “sustentável”).

É esta mais uma fascinante oportunidade histórica de examinarmos em detalhe um fenômeno recorrente na humanidade: a apropriação de idéias, conhecimentos científicos e tecnologias por parte de certas parcelas de uma comunidade para, em nome da renovação, procurar manter o presente estado de coisas.

No próximo artigo avançaremos mais.