Ambientalismo e Desenvolvimento (2)

Artigo 22, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Mar 2008

© 2005-2018 Fabio Ortiz Jr

 

Capítulo Seis, ainda:  avancemos no exame das relações entre Ambientalismo e Desenvolvimento.

No artigo anterior mencionei o chamado “discurso do crescimento”, hoje atualizado para um discurso do desenvolvimento, de preferência ”sustentável”.

Enquanto examinávamos a Terra vista do espaço e descíamos em sua direção, evoquei ainda a metáfora da fruta que apodrece no cesto e nesta lenta aproximação tomamos como exemplo o Estado de São Paulo.

Mesmo hoje, na interpretação do significado das manchas coloridas observadas, alguns exaltarão a ocupação humana alcançada em quase todo o território: estradas, barragens, campos agrícolas, pastagens, minerações, canaviais, eucaliptais... e as estranhas manchas cinzentas, as manchas urbanas.  Pouco resta que não represente forte intervenção humana.

Outros, como eu, passado o momento inicial de apreciação e desfrute de uma tão ampla visão, serão tomados por uma crescente apreensão.  Pouco resta que não represente intervenção humana irrefletida e sem compreensão do que realmente significa esta tão devastadoramente descuidada ocupação.

Crescer, na natureza tudo cresce: humanos, animais outros, plantas, quase tudo cresce em tamanho e número.  Vírus, bactérias e fungos crescem, principalmente em número; até mesmo os cristais minerais crescem (e câncer também cresce).

Quando organismos (ou sistemas) diferentes entram em contato, surgem muitas possibilidades de interação.  Examinemos resumidamente quatro destas hipóteses, especialmente no caso em que uma das espécies é muitíssimo menor em tamanho do que a outra como, por exemplo, nós e algum tipo de bactéria:

- na primeira hipótese, as bactérias acabam eliminadas por nossas defesas e saímos ilesos;

- na segunda, nossas defesas não dão conta imediata das invasoras e desenvolve-se uma extenuante batalha para se ver quem vence, numa infecção crônica e de resultado incerto;

- na terceira, nós hospedeiros somos vencidos pelas invasoras.  Morremos e, como conseqüência, elas morrem a seguir;

- na quarta, surge uma situação nova: é estabelecido um relacionamento de proveito mútuo, uma parceria chamada simbiose (do grego sumbiosis, “vida em comum”), onde um beneficia-se com a existência do outro.

Muitos de nós que estamos vivos já passamos por três destas situações; muitos dos que já morreram passaram pelas quatro.

É muito freqüente que passemos pela primeira e é certo que passamos todos pela quarta, pois temos em

nós colônias de microorganismos que nos habitam, fazendo por nós muito do trabalho para o qual não estamos perfeitamente aptos como, por exemplo, a digestão de certas substâncias.  Quase todos já ouvimos falar de nossa “flora intestinal” (talvez fosse melhor dizer “fauna”).

Como se fossem providas de fina inteligência, elas não apenas crescem em tamanho e número; elas criam uma estratégia de desenvolvimento ao estabelecerem um relacionamento mutuamente benéfico conosco (na verdade, nós mesmos somos um complexo arranjo de várias colônias especializadas, um assunto para outro artigo).

Na distinção entre crescimento e desenvolvimento torna-se necessário acender algumas velas para melhor iluminar o recinto.

O discurso político, pressionado pelo aumento de consciência da população, rapidamente se adapta, apropriando-se de termos emergentes (meio ambiente, desenvolvimento, sustentabilidade, educação ambiental) mesmo que sua compreensão continue como estava, pouca ou nenhuma.

As expressões “meio ambiente”, “desenvolvimento sustentável”, “educação ambiental” são expressões redundantes, são pleonasmos (é o popular “subir pra cima”, “descer pra baixo”):

- “meio” e “ambiente” significam a mesma coisa;

- “desenvolvimento” pressupõe “sustentabilidade”, como vimos nos exemplos de há pouco, senão torna-se mero crescimento;

- falar de “educação ambiental” é tratar de educação, sem meias palavras; e Educação, como vimos nos últimos artigos (Educação e Ambientalismo), só faz sentido se praticada de maneira integrada e integradora desde a origem, criando uma visão ambientalista para a compreensão e o desenvolvimento pessoal e coletivo.

A Ecologia é uma ciência, o Ambientalismo é um modo de ver e de praticar.

A visão ambientalista é uma abordagem já de início integradora porque holística, não-segmentadora do conhecimento e das relações envolvidas (o nosso maravilhoso Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa diz: “holismo é a abordagem que prioriza o entendimento integral dos fenômenos, em oposição ao procedimento analítico em que seus componentes são tomados isoladamente”).

Como vimos em sistemas (v. artigos Ambiente e Ecologia), o todo não é apenas a junção ou soma das partes.

Estes conceitos e expressões, a apropriação indébita dos “espertos” de sempre busca transformá-los em moda alienante, um culto ao desconhecimento para que tudo permaneça como está e seus interesses particulares não sejam incomodados.

No próximo artigo aprofundaremos esta reflexão.