Cenas

Artigo 1, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Ago/Set 2005

© 2005-2018 Fabio Ortiz Jr

 

As cenas talvez falem por si mesmas.

Cena 1:  estou na hoje mais famosa avenida de São Paulo.  Passa um carrão, desses do ano, vejo a janela se abrir por um instante e eis que voa um jornal.  Inteiro.

Cena 2:  poucos minutos depois, vejo uma janela de ônibus se abrir.  Voa uma lata de refrigerante.

Cena 3:  recebo um folheto de propaganda de um dos inúmeros distribuidores que fazem um bico nas calçadas.  Leio, não me interessa.  O chão está cheio deles, procuro pela lata de lixo que deveria estar ali.  Não está, foi queimada.

Cena 4:  olho as águas do Rio da Prata, próximo à fonte.  Parecem claras e fico feliz de estar em um lugar assim.  Lembro que mais claras ainda estão as águas do córrego no Santa Cruz, que vão dar no Córrego da Machadinha, que vai dar no Ribeirão do Lajeado, que vai dar no Capivari e no Rio Grande e no Paraná, que vai dar no Rio da Prata, que vai dar no Oceano Atlântico.  É 2000.

Cena 5:  olho as águas do Rio da Prata, próximo à fonte.  Já não parecem tão claras, como também não as águas do córrego no Santa Cruz, que vão dar no Córrego da Machadinha...  Já não estou tão feliz no final de 2004.

O nosso Brasil é um país estranho, imensamente rico e imensamente pobre.  Relembrando o que já observei em outros países, chego a pensar que nossa riqueza é também a nossa miséria.  A Carta de Pero Vaz de Caminha dizia ao rei que “em se plantando, tudo dá”, celebrando assim a fartura destas terras.  Dava.

Séculos de exploração predatória têm exaurido nossos recursos, nossa exuberância, nossa paciência.  Mas ainda não nossa esperança, pois, de uma forma até surpreendente, perseveramos na crença de que conseguiremos mudar o rumo das coisas e a qualidade de nossas vidas, quer como indivíduos, quer como comunidade, quer como nação e mesmo como espécie.

Como as águas do Rio da Prata, que vão dar no Capivari, que vai dar no Rio Grande...