Democracia e Utopia (2)

Artigo 32, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Jan 2009

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Capítulo Dez: aprofundemos nossa reflexão sobre a relação entre Democracia e Utopia.

Nos artigos anteriores tratamos do estado do mundo humano como resultante dos anseios (sonhos felizes ou pesadelos) de todos e abordamos a crise atual, algumas formas de governo, a democracia, o desejo humano básico e a responsabilidade de cada um e de todos.

O luminoso Albert Einstein (1879-1955, alemão), físico, matemático, pensador, violinista amador, um dos maiores gênios que a humanidade já revelou, continuará ainda por muito tempo campeando a jornada humana.  Disse ele:

Em tempos de crise só a imaginação é mais importante que o conhecimento.“

Einstein não se furtou a suas responsabilidades de cidadão e cientista, expondo sua visão em inúmeras ocasiões.  Poucos sabem que ele foi expulso de sua escola, quando estudante, reprovado em Física por conta de um professor e de um método extremamente autoritários.  Pretendendo aferir o aprendizado de seus alunos a respeito de um tema apresentado, o professor deu-lhes um problema a resolver.  Enquanto os outros alunos escreviam e calculavam, Einstein, folha em branco à sua frente, refletia absorto em pensamentos.  Pouco antes de terminar o tempo dado, passou a escrever e afinal entregou sua prova.  Corrigidas, na aula seguinte elas foram mostradas aos alunos; Einstein recebera zero.

O testemunho é de um colega seu, mais tarde também um reconhecido cientista: Einstein contestou sua nota, afirmando que sua resposta estava correta e merecia nota máxima.  O professor reafirmou a reprovação, dizendo que ele não respondera à questão, sua resposta estava errada.  Einstein então demonstrou que havia respondido à questão de dez maneiras diferentes entre si, todas elas chegando ao mesmo e correto resultado, como o do professor.  A discussão terminou com a reprovação final e expulsão de Einstein da escola.

Mostrando sua total compreensão do assunto (a história toda não cabe aqui), ele havia resolvido o problema de dez maneiras diferentes, exceto da forma que o tal professor esperava que os alunos o fizessem (na verdade, mera reprodução do que ele os havia treinado a fazerem).  Einstein mais tarde explicou que, embora soubesse o que o professor queria, recusara-se a fazê-lo porque não julgava aquilo prova de aprendizado, mas apenas de mera repetição e não verdadeira educação.

Muitos anos depois, já famoso e tendo recebido por duas vezes o Prêmio Nobel de Física, não furtou-se também a uma provocativa e humorada reflexão quanto aos rumos da humanidade:

Só há duas coisas infinitas no mundo: o universo e a estupidez humana.  Mas não estou bem certo quanto à primeira.”

Suas reflexões espalharam-se sobre inúmeros aspectos da vida humana como a ciência, a música, a filosofia, a educação:

A mente que se abre a uma nova idéia jamais volta a seu tamanho original.”

"Uma pessoa inteligente resolve um problema, um sábio o previne."

E também pela política:

"... sob certas condições, os capitalistas privados inevitavelmente controlam, direta ou indiretamente, as principais fontes de informação (imprensa, [tv] rádio, educação).  É então extremamente difícil, e na maior parte dos casos na verdade quase impossível, para o cidadão individual chegar a conclusões objetivas."

O meu ideal político é a democracia, para que cada homem seja respeitado como indivíduo e nenhum venerado.”

A respeito dos desafios da imaginação e da ousadia da transformação, George Bernard Shaw, escritor irlandês já aqui citado, nos disse:

“Algumas pessoas vêem as coisas como elas são e se perguntam: ‘Por quê?’  Eu sonho com coisas que nunca existiram e me pergunto: por que não?”

Fernando Pessoa (1888-1935, português), poeta e escritor, talvez a estrela mais brilhante da língua portuguesa, refletia:

Alguns têm na vida um grande sonho e faltam a esse sonho.  Outros não têm na vida nenhum sonho; e faltam a esse também.”

Já o escritor uruguaio Eduardo Galeano nos traz à reflexão o seguinte relato:

A história passada está de pernas para cima porque a realidade anda de cabeça para baixo.  E não apenas no sul da América: também no Norte.  Quem, nos Estados Unidos, não conhece Theodore Roosevelt?  Este herói nacional predicou a guerra e a praticou contra os fracos: a guerra, proclamou Roosevelt, purifica a alma e melhora a raça.  Portanto, recebeu o Prêmio Nobel da Paz.  Em compensação, quem conhece, nos Estados Unidos, Charles Drew?  Não é que a história o tenha conhecido, simplesmente jamais o conheceu.  No entanto, este cientista salvou muitos milhões de vidas humanas desde que suas pesquisas tornaram possíveis a conservação e transfusão de plasma [sanguíneo].  Drew era diretor da Cruz Vermelha nos Estados Unidos.  Em 1942, a Cruz Vermelha proibiu a transfusão de sangue de negros.  Então Drew se demitiu.  Drew era negro.

Daqui a poucos dias de quando escrevo, 67 anos depois, Barack Obama, negro e presidente eleito, assumirá a presidência dos Estados Unidos da América.  No Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, nascido nas parcelas mais humildes da população, a 2 anos do término de seu segundo mandato governa o país em meio a grave crise mundial reconhecido, aplaudido e sustentado por 80% dos brasileiros.  Não é pouca coisa; ajudêmo-los, com ações e com críticas que construam.

Continuaremos na próxima.

* * *

Em tempo: Einstein não recebeu o Nobel de Física por duas vezes, embora o merecesse (o único físico a conseguí-lo foi John Bardeen, estadunidense).  Einstein recebeu o Nobel de 1921 (só anunciado no ano seguinte) por conta de sua explicação para o efeito fotoelétrico.  O ano de 1905 é conhecido como o seu "Annus Mirabilis", ano miraculoso, já que aí publicou quatro dos mais importantes artigos científicos do século 20 sobre o efeito fotoelétrico, o movimento browniano, a relatividade restrita e o conceito de massa inercial (resumido na famosa equação E=mc2).