Ecologia e Educação (1)

Artigo 16, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Mar/Abr 2007

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Capítulo Quatro: já falamos de Tempo em sua relação com Espaço, idem para Espaço e Ambiente e para Ambiente e Ecologia.  Tratemos agora da relação entre Ecologia e Educação.

Vimos que em nossa existência atendemos a impulsos: como indivíduos, alimentamo-nos, crescemos, procuramos nos desenvolver.  Como espécie, reproduzimo-nos.

Se, como espécie ou como indivíduos, pretendemos continuar a existir, é certo que procuramos cuidar disso.  Ou não?

Ora, em Ecologia (o estudo do lugar onde se vive) vimos que se como indivíduos, como população e como espécie ocupamos espaços ao longo do tempo, se assim fazemos parte de um ambiente com sua dinâmica ecológica e se nossa intenção é continuarmos a existir, então é chegada a hora de uma intensa pausa para uma profunda reflexão.

Afinal, para quê serve uma criança?

Esta pergunta chocou-me quando a ouvi (na verdade, li) pela primeira vez.  Mas rapidamente me refiz, pois o contexto em que ela era feita indicava que o autor era um indagador sério.

Como educador e como consultor de corporações, eu procurava me aprofundar na compreensão do que vem a ser conhecimento e sua possível gestão.

No texto, o autor da pergunta (lamento não lembrar-me onde o li) tratava do conhecimento e de como as empresas o negligenciam, mesmo dele necessitando tanto e estando ele bem debaixo de seus narizes, em seus funcionários, em suas rotinas e em seus arquivos.  As empresas (e as pessoas) tendem a ver o conhecimento e sua gestão como despesa (e muitas vezes inútil) ao invés de concebê-los como investimento essencial ao seu, digamos, bem-estar.

Nessa busca, estendi minhas pesquisas e os conceitos para “organizações em geral”, agrupamentos humanos de qualquer natureza.

Entre outras coisas, descobri que a pergunta já havia sido feita muito antes: Michael Faraday (inglês, 1791-1867), considerado o maior físico-químico experimental conhecido e um dos grandes na divulgação científica, usou-a como resposta a uma impertinente indagação...

Numa de suas populares palestras, em Novembro de 1831, Faraday demonstrou como produzir uma corrente elétrica com um ímã e fios enrolados (bobinas); ele havia acabado de descobrir o fenômeno que chamou de “indução eletromagnética” (lembrem-se de que estávamos no século 19 e não havia eletricidade disponível, a força-motriz eram as máquinas a vapor).

Há duas versões folclóricas para o episódio.

Uma diz que a Rainha Alexandrina Vitória perguntou-lhe ao final “para quê serviria o que ele descobrira”.  Sua resposta imediata foi “Majestade, para quê serve uma criança ao nascer?

Outra versão conta que o Ministro das Finanças, William Gladstone, teria perguntado “Está tudo muito bem, mas para quê serve afinal esta indução eletromagnética?”, ao que ele teria respondido “Ainda não sei, mas um dia o senhor poderá cobrar impostos sobre isso”.

Seja como for, as teorias de Faraday tornaram-se a base de quase toda a tecnologia do século 20, esse turbulento século que acabamos de viver.

Ainda naquele 1831 Faraday inventou o dínamo, que convertia força mecânica em força elétrica, e sua “indução eletromagnética” serviu para que o físico Joseph Henry (americano, 1797-1878) descobrisse o princípio do motor elétrico, que convertia energia elétrica em energia mecânica.  Você consegue imaginar nosso mundinho de hoje sem motores elétricos?

Aprendi ainda que, muito tempo antes, Platão (filósofo grego, 370 aC) já havia se defrontado com a impertinente indagação quando um aluno impaciente lhe perguntou sobre a serventia prática do que estavam ali aprendendo.  Conta-se que Platão o dispensou, simplesmente, devolvendo-lhe o dinheiro pago.

Reflita: você se pergunta, afinal, para quê serve isso a que chamamos Educação?

Acredito que uma boa resposta, à Faraday, é uma outra indagação, esta bastante pertinente: para quê serve o seu conhecimento?

Tenho encontrado em vários círculos científicos respostas genéricas e corretas, mas insuficientes, em torno da idéia-percepção sobre ciência (e educação) do tipo “bem, este é o caminho para que não voltemos para trás, mergulhando na barbárie”.

Bem... (e aqui a pausa para respiração é longamente enfática), olhando sem ilusões para o nosso mundo como está, para o nosso modo de viver e as nossas atuais perspectivas, é interessante fazermo-nos de crianças (ou como o chefe indígena) e propormos: “por gentileza, defina barbárie, cara-pálida...”.

Praticamente todos concordarão em discurso com a visão da ciência (e da educação) como um bem social, processo e atividades destinados a um fim social (ou seja, em benefício dos indivíduos e da coletividade), baseados em cooperação e revezamento entre os participantes ao longo do tempo.

A grande questão, como sempre, é a distância entre intenção e gesto.

Quem é que se sente feliz num banco de escola, tendo que ir cotidianamente a uma (e por anos a fio) sem compreender o que é que, raios, está fazendo ali?  E, por decorrência lógica,  o que dizer (ou perguntar) quanto a esta outra atividade a que chamamos trabalho?

Na próxima, complementaremos este capítulo sobre a relação entre Ecologia e Educação (embora, a esta altura, eu aposte que vocês já perceberam qual é).