Ecologia e Educação (2)

Artigo 17, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edições de Ago/Set e Out/Nov 2007

© 2005-2018 Fabio Ortiz Jr

 

Capítulo Quatro: bem, de volta, agora para complementar nossa reflexão sobre Ecologia e Educação.

Vimos, em resumo brevíssimo, que o conjunto das várias espécies a que chamamos de humanidade caminhou mais ou menos coeso na ocupação dos territórios sobre a Terra ao longo de centenas de milhares ou mesmo milhões de anos.

Nessa jornada, por motivos diversos, mas principalmente por competição, várias espécies humanas deixaram de existir. 

O mergulho nesta história que está sendo lentamente desvelada é fascinante e é dramático: sobramos apenas nós.

Todas as demais espécies humanas estão extintas; e mesmo em nossa própria história encontraremos inúmeras populações e mesmo civilizações que, por motivos que agora começam a ser melhor compreendidos, desapareceram.

Talvez não seja demais reafirmar a constatação: não apenas populações ou mesmo civilizações humanas sumiram; espécies foram extintas.

Todos estes fatos são graves, mas é preciso compreender-lhes melhor a natureza, pois alguns são, digamos, mais graves.

Quando uma pequena população desaparece, isto pode ser devido a um fato catastrófico, mas natural, talvez inesperado apenas quanto ao momento.  Temos exemplos hoje bem conhecidos, como os das cidades romanas de Herculano e Pompéia, devastadas por erupções vulcânicas.

Já no caso de uma civilização, sua aniquilação está freqüentemente associada à competição com outra, seja por meio do assalto a seus recursos (é o caso dos nossos cada vez mais escassos indígenas), da guerra escancarada (o caso dos espanhóis de Cortez na América, principalmente a Central) ou escamoteada, como as novas doenças (ainda, p.e., os homens de Cortez).  Basta olhar para a África no último século e ainda hoje.

A coisa pode ser considerada mais grave quando toda uma espécie deixa de existir.  Todo um patrimônio genético pacientemente elaborado por centenas de milhares ou milhões de anos desaparece para sempre.  Era único e nada o substituirá.

O desaparecimento de uma espécie pode ser um fato natural, afinal, a depender de onde se observa o fato da existência, pode-se dizer que a extinção é uma regra e não exceção.

De todas as formas de vida que já surgiram na face da Terra, 99,99% estão extintas, numa história e num processo de 4,6 bilhões de anos.  Como já disse Darwin em suas descobertas, pelos processos de evolução e seleção natural espécies dão origem a novas espécies.

Mas o desaparecimento de uma espécie pode ser provocado.

Pode ser lento, como resultado do processo de seleção natural, seus espaços sendo gradativamente ocupados por outra espécie mais apta e competitiva na disputa por seus recursos.  Porém, pode ser um desaparecimento abrupto, repentino quando se considera escalas de tempo maiores.

Tornou-se até moda o interesse geral pelos dinossauros, sua enorme variedade e seu porte, o terror que sua evocação provoca em nós humanos e o que teria acontecido com eles.

A hipótese mais provável e hoje mais aceita para uma extinção tão generalizada é a de um devastador impacto causado pela queda de um asteróide há cerca de 65 milhões de anos atrás, não faz tanto tempo assim.

Entendam, não apenas todos os dinossauros foram extintos, como também cerca de 70% da vida então existente em nosso planeta.  Uma mudança abrupta, causada pelo impacto, pela energia liberada, pelos incêndios causados, pelo gás carbônico, cinzas e detritos lançados à atmosfera em quantidades colossais, pelo desaparecimento de habitats e recursos necessários ao sustento da vida; e ainda pelo vulcanismo posto em marcha.

Em miúdos, uma profunda (e duradoura) alteração ambiental em escala planetária.

A Terra, a vida nela, mudaram para sempre.  Os dinossauros e 70% da vida na Terra tornaram-se páginas viradas.

Com exceção do vulcanismo (até onde sabemos), é precisamente o que estamos a fazer agora, nós, a última espécie humana que resta nesta história.

Há já um exemplo conhecido na América Central de uma civilização que desapareceu antes mesmo de Cortez chegar, fruto do esgotamento ambiental que ela induziu em seu entorno.

Estamos a provocar uma alteração ambiental em nossa casa, na Terra, em escala tal que só há paralelo num outro evento ainda mais antigo, há centenas de milhões de anos, quando uma outra mudança provocou a extinção de quase todas as formas de vida conhecidas, mais de 90% delas.

Mas há um fato e um exemplo ainda mais eloqüentes: estamos revertendo a história da atmosfera terrestre.

Há bilhões de anos atrás, a atmosfera era simplesmente irrespirável para nós, composta por uma mistura de gases mortais para quase todas as espécies de hoje: gás carbônico, metano, amônia e vapor d’água.  Porém, uma das primitivas formas de vida (as cianobactérias, ainda existentes, felizmente) consumia estes gases para seu sustento e exalava naturalmente o que era sua excreção.

Acontece que nestes excrementos havia um gás novo, ainda não disponível na atmosfera primitiva: oxigênio.  Essas formas de vida prosperaram e assim a atmosfera foi sendo lentamente modificada.

Como uma das conseqüências, iniciou-se a formação, por oxidação e precipitação, de enormes depósitos de ferro.  Uma outra é que, ao longo de muito tempo, novas formas de vida surgiram a partir das novas condições; entre elas, nós.

Existimos e exploramos jazidas de ferro graças a elas, as antigas cianobactérias (antes chamadas, erroneamente, de algas azuis).

Nossa atmosfera é, desde há muito tempo, constituída principalmente por nitrogênio (em volume, 78%), oxigênio (21%), argônio (1%), gás carbônico (0,034%) e vapor d’água, além de vários outros gases em proporções ínfimas.

O que estamos fazendo em escala cada vez maior nos últimos 8 mil anos (mais aceleradamente ainda nos últimos 180 anos e agora dramaticamente) é devolver à atmosfera o gás carbônico e o metano guardados.

Durante milhões de anos as plantas e outras formas de vida fixaram estes gases no solo, o que tornou nossa vida possível; hoje os devolvemos à atmosfera, como que colocando-a de volta no caminho de sua antiga composição.

Uma rota, para nós, suicida.  Mas também, se cabe o termo, homicida ou, mais precisamente, onicida, pois estamos a arrastar para o abismo incontáveis formas de vida.

Tudo isto por conta de nosso estilo de vida, ou seja, deve-se à nossa maneira inconseqüente e irresponsável de nos apropriarmos dos espaços e dos recursos de nosso planeta, deve-se à nossa maneira insana de estabelecermos relações em nossas particulares vidas, para estabelecermos relações então maiores e mais complexas com o nosso entorno, o que nos rodeia e dá sustento, sejam recursos naturais, sejam espécies outras, sejam indivíduos ou comunidades de nossa própria espécie.

Há décadas, há centenas de anos, pessoas que têm consciência do que se passa procuram de alguma forma espalhar esse conhecimento para que consigamos mudar de rota.  Na verdade há milhares de anos este esforço (e às vezes sacrifício) vem acontecendo; em vão, ao que parece, pois chegamos enfim ao momento crucial.

Alterações ambientais e mudanças climáticas que eram anunciadas para um futuro confortável agora estão a bater em nossa porta.  A natureza, como já disse, não é cartesiana: ela é quântica, os processos da natureza acumulam suas forças lentamente para então lançar-se no salto súbito.

Que fazer?

Está claro que, se nosso compromisso é com a vida, então temos que mudar, temos que transformar a nós mesmos e temos que transformar nossas relações.  Estamos lutando pela vida, precisamos reeducar-nos.

Como dito no artigo anterior, apostemos na educação como descolamento à barbárie, sim.  Mas que educação?

No próximo capítulo refletiremos sobre a relação entre Educação e Ambientalismo.