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O Rei Está Nu: o Processo do Conhecimento - método científico (44) Artigo 108, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Mai 2015 © 2005-2018 Fabio Ortiz Jr |
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O Talmude é um dos livros básicos da religião judaica e contém a lei oral, a doutrina, a moral e as tradições dos judeus, constituindo um registro das discussões rabínicas que pertencem à lei, à ética, aos costumes e à história do judaísmo (observemos aqui a contradição dialética de uma ‘lei oral’ escrita). Como todos os livros ou registros originais das várias religiões humanas, revela um conhecimento por vezes, graças à sua atualidade, surpreendente em relação ao mundo que hoje vivemos. Em um de seus momentos de sabedoria, reza o Talmude: “Não vemos as coisas como elas são; nós as vemos como somos.” É fascinante verificar como caminhou o nosso modelo cosmológico, a nossa maneira de conceber o mundo, a vida, o universo, a existência: - o mundo levado sobre o casco de uma tartaruga, - o mundo concebido e dirigido por deuses, - o deus hindu Brahma, condutor do universo, e Vishnu e a serpente Ananta do infinito, - o gigante chinês Phan Ku, que do ovo cósmico segregou os princípios Yin e Yang, - a Terra medieval como um disco plano, com os abismos de além-mar, - a Terra como centro do universo, - as circunavegações que comprovaram uma Terra esférica, - o Sol como centro do sistema, o Sol como parte da galáxia, a galáxia como uma entre muitas, - o universo da física newtoniana (o espaço e o tempo como dimensões distintas, o espaço rígido com referências absolutas), - o universo da física relativística (o espaço e o tempo como aspectos da dimensão una espaço-tempo, sendo esta distorcida pela presença de matéria), - o universo estático, fechado, finito, esférico, - o Big Bang e o universo em expansão, - a foto da Terra que encantou a humanidade, tirada da missão Apolo, - não apenas um universo, mas multiversos. Fazer ciência é um modo de conhecer. Num sentido amplo, é tão antigo quanto a humanidade; num contexto um tanto mais restrito, começou quando o primeiro homem ou mulher passou a registrar de maneira contínua suas observações e experimentos. Já num plano atualizado, requer um rigor metodológico, experimental e documental que foi desenvolvido a duras penas nos últimos oito séculos e particularmente nestes derradeiros 300 anos; sua forma atual, definida pelo método científico, tem apenas algumas dezenas de anos. Entretanto, o embate, já milenar, entre razão e fé permanece irresoluto e espantosamente atual, acirrado pela agonia e reação de um mundo, um modo fundamentalista de ver, conceber e agir, há muito antiquado, oportunista e obsoleto, que, é óbvio, reluta morrer.
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Estamos, observado o contexto geral dos últimos acontecimentos no Brasil e no mundo como um todo, no limiar de uma profunda transição: ou superamos nossas inconsequências, decretando o fim de nossa infância, ou nos aniquilamos de vez. A natureza teve tempo suficiente para desenvolver mecanismos sofisticados de regulação: toda vez que uma espécie cria superpopulações, ela exaure os recursos disponíveis de que se sustenta, o que leva inexoravelmente à sua decadência e, no limite, à extinção. Estamos, em princípio, subordinados às mesmas regras que limitam a existência das demais espécies; dizermo-nos “superiores” por conta da precária consciência que temos a nosso respeito ou entorno não constitui garantia de que consigamos solucionar os graves problemas que criamos a nós mesmos e às demais espécies. A vida (a natureza) teve tempo para experimentar inúmeras possibilidades neste planeta. Ao que parece, nenhum dos processos de sustentação da vida foi descartado pelo caminho: a absorção seletiva dos nutrientes disponíveis no ambiente continua, assim como a fermentação, a fotossíntese e a respiração. Se um dia foram hegemônicos ou não, todos eles encontraram seu nicho e subsistem, pelo menos até aqui; na verdade, como regra geral, alimentam-se reciprocamente, a tudo reciclando, dado o tempo suficiente. Assim, mesmo com a escala de desastres (sem precedentes em sua história) que a humanidade atual insiste introduzir e subestimar, é razoável supor que a vida não se extinguirá (seria a nossa arrogância definitiva). Todas as extinções em massa anteriores, nenhuma delas causada pelo homem, não o conseguiram e provavelmente mesmo a presente não o alcançará, a menos que expulsemos quase toda a água do planeta, a exemplo do que aconteceu naturalmente em Vênus e Marte, como teme e aponta James Lovelock, criador, com Lynn Margulis, da Teoria de Gaia. Certamente, porém, existe o alto risco de a estarmos empurrando nessa direção. As breves pinceladas que temos aqui tramado sobre a recente história da Humanidade ilustram nossa até aqui reiterada incapacidade de bem resolvermo-nos. A cultura e o conhecimento constituem uma longa e minuciosa jornada pelo tempo das experiências e da reflexão para resultarem consolidados e expressos pelos relatos, pelos mitos, pelos ritos. Costumamos avançar relacionando uma nova experiência a outra que a precedeu, uma baliza, uma referência para comparação. Relate um conhecimento elaborado a um ouvinte que, mesmo atento, nenhum marco ou fronteira consegue divisar para ali estabelecer uma cabeça de ponte, uma ligação dele com o que lhe está sendo presenteado ou testemunhado; o que você obterá? Nada, apenas, pois nada terá sido acrescentado ou desenvolvido, porque nada terá sido por ele (re)criado. Talvez apenas desconforto, pois será como atirá-lo ao vazio, em queda livre. Em uma travessia, as pessoas em geral precisam de pedras onde pisar, para que não lhes falte o chão; raras possuem o dom de voar. Neste início de nossa terceira jornada convém relembrar Freud: “Nunca tenha certeza de nada, pois a sabedoria começa com a dúvida.” |
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