O Rei Está Nu: o Processo do Conhecimento - método científico (46)

Artigo 110, publicado no Correio da Serra, Santo Antonio do Pinhal, SP, edição de Jul 2015

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O caráter de um cientista, como o de qualquer pessoa, mostra-se não apenas na maneira como conduz suas investigações e seus trabalhos; ele se revela com eloquência em sua honestidade intelectual.

Dedicado à física teórica, Max Planck também se envolveu profundamente com as instituições: foi professor e depois reitor da Universidade de Berlim.   Foi ainda diretor chefe da Sociedade Alemã de Física, secretário da Academia de Ciências da Prússia, presidente da Sociedade para o Avanço das Ciências e senador da Sociedade Rei Wilhelm.

Seus esforços e contribuições foram reconhecidos e Planck recebeu o Prêmio Nobel de Física, em 1918, por sua já então aceita Teoria Quântica.  Entretanto, nunca se acomodou.

O acompanhamento dos trabalhos de outros cientistas, como parte de suas atribuições administrativas e ainda de seu profundo interesse pessoal, fizeram-no prestar a devida atenção, em 1905, aos trabalhos recentes de um desconhecido jovem pesquisador, publicados no tradicional jornal científico Anais de Física, em Berlim.

O jovem já havia divulgado, em 1900, um pioneiro trabalho sobre capilaridade (interação de forças entre moléculas); mas Planck agora estava vivamente impressionado com seus novos artigos, ênfase dada a um que tratava de um tema denominado Teoria da Relatividade Restrita, sobre a relação entre espaço e tempo (a física do movimento de corpos na ausência de campos gravitacionais).

Os outros três artigos tratavam do movimento browniano (movimento aleatório de partículas suspensas em um fluido líquido ou gasoso), da equivalência entre massa e energia (conceito de massa inercial, resumido na equação E=mc2) e do efeito fotoelétrico.  O autor assinava-se Albert Einstein (1879-1956, alemão).

Nessa época, Einstein trabalhava no escritório de patentes de Berna, Suíça, um emprego quase burocrático, mas que lhe proporcionava o exame de todo tipo de invenção levada a registro, além de tempo.

A Teoria da Relatividade Restrita cativou a atenção de Planck, que a divulgou entre os físicos em Berlim e agiu pela admissão futura de Einstein na Academia de Ciências da Prússia.

Curiosamente, Planck demonstrou mais interesse na Relatividade Restrita do que na explicação para o efeito fotoelétrico, de que, de início, discordou.

Este efeito físico já havia sido observado em 1839 pelo francês Edmond Becquerel (1820-1891) e confirmado, em 1887, pelo alemão Heinrich Hertz (1857-1894): a luz, quando incide sobre um metal, é capaz de deslocar partículas (elétrons).

Porém, a esta altura sabia-se que isto só acontecia com a luz ultravioleta, de alto poder de penetração devido à alta frequência e pequeno comprimento de onda (hoje tão insensatamente usada em “academias de bronzeamento artificial”), mas não se dava com a luz infravermelha, de baixa frequência e grande comprimento de onda, não importando a quantidade desta.

Um destes trabalhos de Albert Einstein usava justamente a Constante de Planck para explicar o efeito fotoelétrico.

A teoria ondulatória da luz (v. artigo anterior) não conseguia explicar este fenômeno, o que levou Einstein a

supor que a luz deveria ser então um fluxo de partículas, a que deu o nome de fótons.

Sua suposição implicava que, ao se chocar com um elétron do metal, o fóton lhe transferia sua energia, como em qualquer choque entre corpos, como já se sabia desde Newton.  Sendo esta energia suficiente, o elétron seria então deslocado de seu estado anterior, o que acontecia se a luz fosse ultravioleta, com fótons de maior energia por conta da alta frequência.

Assim, um único fóton da luz ultravioleta era capaz de realizar o que muitos fótons da luz infravermelha não conseguiam.

Essa energia do fóton era então, para Einstein, também produto de sua frequência e da Constante de Planck, como no caso da radiação para Planck.

O estadunidense Robert Millikan (1868-1953), em seus experimentos de 1914, confirmou esta hipótese, a partir de então tornada Lei ou Teoria do Efeito Fotoelétrico, que deu a Einstein o Nobel de Física em 1921.

A aplicação da teoria quântica por Einstein mostrou que a luz comportava-se como onda e como partícula, pondo fim a uma disputa secular sobre a natureza e o comportamento da luz.

Foi esta a primeira aplicação bem sucedida da teoria de Planck.  Ao verem a Teoria Quântica aplicada com sucesso a outras áreas da Física, a maioria dos cientistas abandonou suas dúvidas a respeito.

Planck e Einstein mantiveram profunda amizade e colaboraram em seus trabalhos, mesmo muitas vezes discordando em seus pontos de vista.

A quantização da luz foi mais tarde usada pelo dinamarquês Niels Bohr (1885-1962) para explicar a estabilidade dos átomos.

O neozelandês Ernest Rutherford (1871-1937) havia proposto um modelo para o átomo que consistia de um núcleo carregado positivamente cercado por elétrons carregados negativamente em sua órbita, numa espécie de sistema planetário.

O problema com esse modelo era que, por decorrência do movimento, os elétrons deveriam perder energia e colidir com o núcleo, o que a realidade mostrava não acontecer, pois os átomos eram estáveis, a matéria continuava a existir.

Certo, mas o que era afinal o átomo, como descrevê-lo, como caracterizá-lo?

Sabia-se, desde séculos, que átomos de substâncias diferentes eram diferentes.  O que mais?

Para refazer este percurso, voltemos no tempo.