Dormimos
para
que
nosso
cérebro descanse e se recupere do
esforço realizado
durante o
estado de
vigília,
pois a
privação prolongada do
sono pode
nos
levar
até
mesmo à
morte.
Entretanto,
ele
não se “desliga”:
longe do
que pode
supor o
senso
comum,
nosso
cérebro continua
ativo
em
outro
patamar,
nosso
inconsciente pode
então se
manifestar naquilo
que chamamos de
sonhos e,
livre das
amarras do
consciente, pode
até
mesmo
resolver
problemas.
Aconteceu
com Mendeleev, neste
caso da
sua
tabela
periódica dos
elementos
químicos.
O
mesmo
já havia se
dado
com August Kekulé
durante
suas
pesquisas
sobre a tetravalência do
carbono e
sua
capacidade de
formar
cadeias,
quando
então,
em 1865, descobriu a
fórmula
hexagonal do
benzeno,
em
que
seis
átomos de
carbono formavam
um
anel, alternando
ligações
simples e
duplas: “Eu
estava sentado à
mesa escrevendo
meu
compêndio,
mas o
trabalho
não rendia; os
meus
pensamentos estavam noutro
lugar. Virei a
cadeira
para a
lareira e comecei a
dormitar.
Outra
vez começaram os
átomos às
cambalhotas
em
frente dos
meus
olhos. Desta
vez os
grupos
menores mantinham-se modestamente à
distância. A
minha
visão
mental, aguçada
por repetidas
visões desta
espécie, podia
distinguir
agora
estruturas
maiores
com variadas
conformações; longas
filas,
por
vezes alinhadas e
muito
juntas; todas torcendo-se e
voltando-se
em
movimentos
serpenteantes.
Mas
olha! O
que é
aquilo? Uma das
serpentes
tinha abocanhado a
própria
cauda e a
forma
que fazia rodopiava caçoante
diante dos
meus
olhos.
Como se tivesse se produzido
um
relâmpago, acordei... e passei o
resto da
noite a
verificar as consequências da
hipótese. Aprendamos a
sonhar,
senhores,
pois
então
talvez
nos apercebamos da
verdade.”
Após
sua
proposição
inicial,
em 1869,
Mendeleev continuou a
pesquisar e
fundamentar
seus
conceitos
para a
elaboração
e refinamento da
Tabela.
Duas
décadas
depois,
na
conhecida
Palestra
Faraday,
ele exporia
novamente
suas
conclusões
e rememoraria os
antecedentes:
“A.
Strecker,
em
seu
trabalho ‘Teorias
e
experiências
para
determinar
as
massas
atômicas dos
elementos’
(Braunschweig, 1859),
depois
de
resumir os
dados
relativos
ao
assunto,
e apontando a
notável
série
de equivalentes
Cr=26.2 Mn=27.6 Fe=28 N=29 Co=30
Cu=31.7 Zn=32.5
observa
que:
‘É
pouco
provável
que
todas as
relações
acima
mencionadas
entre
os
pesos
atômicos (ou
equivalentes) de
elementos
quimicamente
análogos
sejam
meramente
acidentais.
Devemos, no
entanto,
deixar
para o
futuro
a
descoberta
da
lei
das
relações
que
aparece nestas
figuras’.
Nessas
tentativas
de
arranjo
e
em
tais
visões
devem
ser
reconhecidos os verdadeiros
precursores
da
lei
periódica.
O
terreno
foi
preparado
entre
1860 e 1870 e
não
foi
expresso
de uma
forma
determinada
antes
do
final
da
década;
isso
pode, suponho,
ser
atribuído ao
fato
de
que
apenas
elementos
análogos
foram comparados.
A
idéia
de
procurar
uma
relação
entre
os
pesos
atômicos de
todos
os
elementos
era
estranha
às
idéias
de
então,
de
modo
que
nem
o
parafuso
telúrico
de De Chancourtois,
nem
a
lei
das
oitavas
de Newlands poderiam
garantir
a
atenção
de
ninguém.
E, no
entanto,
tanto
De Chancourtois
como
Newlands,
assim
como
Dumas e Strecker,
mais
do
que
Lenssen e Pettenkofer, haviam abordado a
lei
periódica
e
descoberto
suas
sementes.
A
solução do
problema
avançava
lentamente,
porque
os
fatos,
e
não
a
lei,
estavam
acima
de
tudo
em
todas as |
tentativas;
e a
lei
não
poderia
despertar
um
interesse
geral
enquanto
os
elementos,
sem
conexão
aparente
uns
com
os
outros,
fossem incluídos na
mesma
oitava...”
Como
vimos,
sem
saber
um do
outro, Meyer e Mendeleev chegaram a
conclusões e
propostas
muito parecidas,
embora o
alemão privilegiasse o
enfoque
físico
enquanto o russo preferia o
olhar
químico.
Por
que
então o
trabalho de Mendeleev conquistou a
hegemonia no
mundo
científico?
Meyer hesitou
frente aos questionamentos
que lançavam
dúvidas
sobre a
desordem
aparente dos
elementos,
que veremos
adiante, e
também
quanto ao
desajuste de
alguns
elementos
em
relação aos
grupos
em
que foram colocados,
além da
falta de
elementos
que dessem
coerência ao
esquema
geral.
Mendeleev, ao
contrário de
seus
antecessores, confiava o
bastante
em
sua
proposta de
tabela
para usá-la
até
mesmo na
previsão de
elementos
novos e nas
propriedades de
seus
compostos, tendo desafiado
saberes estabelecidos e corrigido
pesos atômicos de
alguns
elementos
conhecidos.
Enquanto
outros,
embora
competentes, haviam vacilado, Mendeleev
mostrara-se
seguro
em
seu
caminho e
em
suas afirmações.
Onde
buscara essa
força?
Sua
trajetória de
imensos
desafios e superações,
como temos relatado,
certamente
nos dá uma boa
pista.
Desenvolvida
por
um
olhar
essencialmente
químico, a
Tabela
Periódica dos
Elementos
proposta
por Mendeleev,
após
anos de calorosas
discussões, acabaria
por
ser
bem aceita pelas
décadas
seguintes,
mesmo
antes de serem estabelecidas
suas
fundamentações
sob
um
olhar
físico.
Foi,
porém, uma
longa
batalha: a
comunidade
científica,
apesar da
firmeza de Mendeleev,
não se convenceu de
que
aquele
modelo
era
por
inteiro
correto. Algumas
inconsistências mostravam-se
evidentes: uma
era a
posição de
certos
elementos de
massa atômica
bem próximas,
mas
com
propriedades
muito
diferentes.
Questões
como esta faziam
com
que os
cientistas desconfiassem
que o
peso (massa)
atômico
talvez
não fosse uma
variável adequada
como
critério
para a
organização dos
elementos. O
que, de
resto,
era antecipado
pelo
substrato do
genial
trabalho de Mendeleev, num
exemplo
notável de
aplicação do
método
científico.
Como
bem sabemos a esta
altura, a
resposta
científica a
um
problema
sempre traz
em
seu
bojo o
surgimento de
novas
questões. Tratava-se,
até
aqui, de classificação, a
montagem
científica de
um
quadro
geral de
relações e de
características
individuais.
Nada
ainda (ou
quase)
sobre a
intimidade do
átomo. |